Falta mais de um ano para a eleição de 2022, e como gostam de repetir os versados na arte da política, tudo pode acontecer em uma disputa presidencial – inclusive nada. Mas a baixa adesão às manifestações de ontem contra o presidente Bolsonaro, apoiadas pelos presidenciáveis Ciro Gomes e João Dória, e por movimentos como o MBL, levantou uma questão tão velha quanto a própria democracia brasileira: um candidato de terceira via tem chances de sair com a faixa presidencial, após o próximo pleito?
Antes de oferecer alguma resposta, vamos analisar os dados históricos das últimas corridas pelo planalto. Ciro Gomes, por exemplo, já disputou três vezes a presidência da República, nunca ultrapassando os 12% de preferência do eleitorado – o mesmo percentual com que aparece em diversas pesquisas divulgadas recentemente.
Em 1998 Ciro Gomes foi candidato pelo PPS, obtendo pouco mais de 11% dos votos. Na eleição seguinte, em 2002, ainda pelo PPS, Ciro ultrapassou os 12% - mesmo índice obtido vinte anos depois, em 2018, quando ele também encerrou o pleito com pouco mais de 12% dos votos válidos. Nas três ele ganhou em apenas um estado – o seu Ceará.
Neste intervalo de duas décadas Ciro continua sendo o candidato dele mesmo, buscando o que políticos tradicionais chamam de “voto solto”, da população mais politizada e intelectualizada, que admira sua retórica técnica e seu conhecimento sobre o país. Neste período ele não construiu um partido, um bloco político, uma rede de apoiadores ou uma densidade relevante para as redes – terá agora um ano para fazer o que não realizou em vinte. E está tentando.
Marina Silva
O nome que se apresentou como terceira via e obteve melhor desempenho eleitoral nas corridas presidenciais foi a petista arrependida Marina Silva, que disputou em 2010 (19%) e 2014 (21%). Marina foi a mais votada em dois estados: o Acre, onde nasceu e fez carreira política, e Pernambuco, onde o PSB (partido pelo qual ela disputou os dois pleitos) tinha a força de Eduardo Campos.
Qualquer canidato que vislumbre desbancar Lula ou Bolsonaro para chegar ao segundo turno precisa ultrapassar o sarrafo dos 21% atingido pela Marina. Mas até o momento não há indícios de que isso possa acontecer – mesmo levando em conta que a um ano do pleito, em uma pesquisa, dados como a rejeição podem ser mais relevantes do que a intenção de voto.
Brizola e Garotinho
Depois de Marina, a melhor performance de um candidato que se apresentou fora da tal polarização (não era majoritariamente chamada assim nas eleições anteriores) foi Leonel Brizola, que em 1989, primeira eleição após a redemocratização, obteve mais de 16% dos votos e ganhou em três estados: Rio de Janeiro (do qual fora governador), Rio Grande do Sul (onde nasceu) e Santa Catarina. Lula e Collor fizeram a história disputa do segundo turno.
Em 1994 a medalha de bronze (que na verdade não existe na corrida presidencial) ficou com Eneas, que amargou magros 7%. Na eleição seguinte, 1998, deu Ciro em terceiro, atrás de FHC e Lula. 2002 foi ano de novidades, com o ex-governador do Rio, Anthony Garotinho, chegando aos 17% e tirando o terceiro lugar de Ciro, que continuou com os seus 12%. Lula enfrentou Serra no segundo turno.
Pausa para breve observação: As terceiras posições obtidas por Brizola e Garotinho, em anos diferentes, além da própria vitória de Bolsonaro em 2018, mostra que o estado do Rio de Janeiro continua tendo papel extremamente relevante para quem almeja vestir a faixa verde e amarela.
O ano era 2006 e a terceira via foi representada pela combativa senadora (e ex-filiada ao PT) Heloísa Gelena, que patinou nos 6%. Lula conseguiu sua reeleição, sobre Geraldo Alkmin, que pelo menos ganhou um dos melhores apelidos já vistos entre presidenciáveis: picolé de chuchu.
Ciro e a direita
Experiente e versado nas artes das guerras políticas, Ciro Gomes pode ter percebido a inviabilidade de uma terceira via na eleição do próximo ano. Isso pode ter sido determinante para que ele tente agora se apresentar como uma opção para o voto da direita. Suas insistentes e constantes críticas aos governos do PT (que ele mesmo integrou), e mais ainda, à pessoa de Lula, podem mostrar que ele tenta se desvincular da pecha de “esquerdista/comunista”, como gostam de classificar os radicais da direita.
A proximidade de Ciro a movimentos como o MBL, o diálogo constante com partidos como o DEM e a participação nos miados protestos do último domingo, 12, deixam claro essa tentativa. O Cearense, que já chegou a vaticinar a queda do presidente Bolsonaro, talvez aposte nisso mesmo, na implosão de um governo ruim, que gerou péssimos resultados na economia, aumentou desemprego, pobreza, cortou gastos na educação e não lidou bem com a pandemia, além de promover um clima de tensão e beligerância permanente, o que é criticado diuturnamente inclusive pelo tal do “mercado” e seus representantes com face.
Ruindo Bolsonaro, a dirieta ficaria órfã de um nome conhecido, com experiência, que seja viável e que possua chances eleitorais num embate com o ex-presidente Lula. Ou seja, Ciro Gomes aposta que o capitão caia da montaria e que o cavalo da direita passe selado em sua frente, já que a terceira via tente a continua e deve continuar onde sempre esteve: em terceiro lugar e fora do segundo turno.
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