Poder e Cotidiano em Sergipe
11 de Março 8H:01
COTIDIANO

Criadora da Feirinha da Gambiarra fala sobre o atual cenário do empreendedorismo e seus desafios

Criadora da Feirinha da Gambiarra, evento realizado há 10 anos em Aracaju em prol do empreendedorismo local, a arquiteta urbanista e empreendedora Isabele Ribeiro está no ramo do empreendedorismo mesmo antes da criação desse projeto, marcado por ser a primeira feirinha criativa de Sergipe. Assim, compartilhando seu conhecimento a respeito desse filão, a arquiteta falou sobre sua visão a respeito de investir no próprio negócio, trazendo o crescimento dos pequenos empreendedores durante a pandemia.

Ela trouxe ainda uma discussão a respeito do cenário do empreendedorismo a nível local, os desafios de manter o próprio negócio, especialmente para mulheres, e como acontece a dinâmica da Feirinha da Gambiarra. Confira tudo isso na entrevista a seguir:

Conte um pouco sobre a Feirinha da Gambiarra e qual o propósito do evento.
Este ano, estamos completando 10 anos de Feirinha da Gambiarra, pois ela surgiu em 2012, quando muitas empreendedoras buscaram o brechó que eu tinha na época para vender seus produtos. Houve um momento em que chegavam tantas expositoras que eu não tinha mais espaço, porque o espaço era bem pequeno.

Começamos ali, na porta do brechó mesmo, com 12 expositores. Desde então fomos crescendo naturalmente, melhorando a gestão, entendendo o público. Hoje já temos cerca de 100 expositores por edição. O nosso propósito é dar espaço e visibilidade para pequenos empreendedores mostrarem seu trabalho, contribuindo para o empreendedorismo local e, unindo tudo isso a uma programação cultural, proporcionar à população um local de lazer e apreciação dos espaços públicos.

Com o crescimento do empreendedorismo e o sucesso da Feirinha, você pensa em levá-la para outros estados?
Sim, estamos exatamente nesse momento de transição, inclusive porque a Feirinha é um evento totalmente gratuito que, para ser possível ser executado com o nível de cuidado que fazemos hoje, precisa de suporte do poder público. Algumas cidades já entraram em contato com a gente com o desejo de ter a feirinha movimentando seus empreendedores e estamos nesse processo de levar a Gambiarra para uma tour em outros lugares.

Em Aracaju, como você enxerga o atual cenário do empreendedorismo? Está favorável, cresceu muito? Se tornou a oportunidade de muitas pessoas?
Aracaju é uma cidade muito boa para o empreender por ser pequena, todo mundo se conhece, tudo fica muito perto, as oportunidades podem ser facilitadas se você souber fazer networking, por exemplo. Mas ainda temos muito o que caminhar. Por exemplo, melhorando nossa autoestima, voltando o olhar da gestão pública para uma formação empreendedora de qualidade tanto da educação básica quanto para os empreendedores que já atuam no mercado. Além disso, é essencial que a gente entenda que é importantíssimo ter uma olhar global para os nossos negócios, dar adeus à síndrome de pequenez e entender que temos muito negócio para fazer com os outros estados e com o mundo, somos potentes e não sabemos.

Isabele Ribeiro, arquiteta e urbanista e criadora do projeto Feirinha da Gambiarra

Em 2020, o número de empreendedores no Brasil cresceu significativamente. Como criadora de um evento tem como isso como base (empreendedorismo), nas edições que puderam ser realizadas depois da pandemia e até hoje, foi possível notar esse aumento? Por exemplo, surgiram mais expositores ou algo assim?
Sim, foi perceptível o aumento e a chegada de novas marcas, tanto na Feirinha quanto na nossa loja colaborativa. A realidade é que muitas pessoas se viram sem saída e criaram soluções para ganhar dinheiro, muitas inclusive saindo dos seus empregos porque foram demitidas e criando seus pequenos negócios com o dinheiro recebido pelo auxílio emergencial. Fico feliz, mas é muito preocupante a sustentabilidade deles pelo problema de empreender por necessidade, por ser muito bonito, com histórias de sucesso ou muito perigoso.

Você acredita que o empreendedorismo se tornou uma forma mais compensadora de atuação profissional do que o trabalho “convencional”?
Depende de qual perspectiva. O empreendedorismo no Brasil é, em sua grande maioria, por necessidade. As pessoas não enxergam vaga no mercado e acabam criando a sua própria "vaga". Isso tem um risco enorme porque a maioria dessas pessoas que empreendem por necessidade estão, muitas vezes, começando sem capital de giro suficiente para criar uma empresa de forma duradoura. Assim como a gigante maioria de nós não tem o aprendizado de partes essenciais para sustentabilidade de um negócio como educação financeira ou inteligência emocional logo nos primeiros anos escolares. Ou seja, empreender é uma escolha que traz a escalabilidade do seu poder financeiro porque se você acerta na escolha e na receita, pode fazer mais do que num emprego fixo. No entanto, se não constrói da maneira certa, pode passar o resto da vida trabalhando errado, com dívidas incontáveis e saúde mental prejudicada.

Por que empreender, nos dias atuais, tem sido a opção mais buscada? A pandemia tem algo a ver com isso ou, mesmo antes, você já sentia essa vontade crescendo nas pessoas?
Acredito muito que a pandemia seja responsável por um crescimento no cenário do empreendedorismo, como comentamos, por necessidade. Mas além disso posso arriscar que, por outro lado, muitas pessoas tem buscado, talvez também por consequência dos aprendizados duros da pandemia, empreender por um propósito ou vários deles. Pessoas que abriram mão dos seus empregos fixos para ficar mais tempo com sua família ou ter mais flexibilidade de viajar, fazer melhor proveito do tempo vivido, experienciar mais coisas ou até mesmo empreender por um propósito criando marcas com apelo social ou ambiental.

No mercado brasileiro, o Mapa de Negócios de Impacto Socioambiental de 2021 mostrou que mulheres empreendedoras recebem menos investimentos. Além desse, quais os desafios que mulheres empreendedoras enfrentam?
Os desafios são diários e, diria, incômodos a ponto de fazer muitas empreendedoras desistirem no meio da jornada. Podemos começar falando das mulheres que são mães solo, por exemplo, e que não conseguem tempo suficiente para os estudos diários que ter uma empresa exige, como curso de atualização ou networking. Ela se vê mergulhada por cumprir as tarefas básicas do dia a dia, cuidar do filho e executar, geralmente, todas as funções da sua pequena empresa: criar conteúdo, marketing, vendas, atendimento, financeiro, contábil. É um equilibrismo que quase sempre fere a saúde mental dessas mulheres de forma profunda, mas invisível. Mulheres são desacreditadas todos os dias, numa roda de conversa ou num encontro de negócios, que quase sempre são minoria. Nosso esforço deve sempre ser três vezes maior do que o dos homens para alcançar o mesmo ponto, mesmo tendo a mesma capacidade técnica e criativa num negócio.

Como empreendedora já há muito tempo, que dica você daria para quem está começando agora nesse setor?
Diria pra estudar muito buscando estruturar uma empresa sustentável e que te traga bons resultados, entender bem da parte burocrática, impostos, contabilidade, parte jurídica, branding e todos os riscos diários de ter uma empresa. A gente precisa parar de romantizar o empreendedorismo porque a realidade não é tão bonita quanto os empreendedores vendem na internet e isso pode ser muito perigoso até para saúde mental de empreendedores, me preocupo muito com o futuro do empreendedorismo no país e entendo que profissionalização é uma pauta urgente.

O que você pode contar sobre a primeira edição da Feirinha da Gambiarra em 2022?
Que estamos retornando com todo cuidado que sempre tivemos em cada detalhe e que a exigência da carteira de vacinação, além dos cuidados básicos de uso de máscara durante todo o evento nos deixam tranquilas para seguir fazendo a Feirinha com a mesma responsabilidade de sempre. Teremos o retorno dos bate papos no evento, o nosso Prosa Gambiarra que o público tanto gosta.

 

Comentários

  • Seja o(a) primeiro(a) a comentar!

Deixe seu comentário

Imagem de Segurança
* CAMPOS OBRIGATÓRIOS

Newsletter

Cadastre seu e-mail e receba do nosso blog muitas novidades.