Atendendo uma solicitação do STF, o Tribunal de Contas de Sergipe realizou um levantamento sobre as obras paralisadas em Sergipe. O número assombra: são mais de 300, espalhadas por praticamente todos os municípios sergipanos.
O TCE apurou que essa paralisação gera um prejuízo de R$ 440 milhões e apontou que em alguns casos, obras com mais de 90% dos serviços executados foram paralisadas.
Nesta entrevista ao BLOG DO MAX o presidente do TCE, conselheiro Ulices Andrade, falou sobre os motivos que mais geram paralisação de obras e opinou sobre as possíveis soluções para este descalabro. Confira a seguir.
BLOG DO MAX - O TCE realizou um estudo para apurar quantas obras paradas existem em Sergipe. Qual é esse número hoje?
Ulices Andrade - Foi um trabalho muito bem feito pela equipe técnica da Diretoria de Controle Externo de Obras e Serviços, a DCEOS, que, na sua primeira etapa, ainda no primeiro semestre de 2018, chegou a um quantitativo de 300 obras paralisadas em Sergipe, distribuídas por praticamente todos os municípios do nosso estado.
BM - Essas obras paradas geram algum tipo de prejuízo para o poder público? Qual? Porque?
UA - Sem dúvida. Apenas com as obras detectadas neste estudo, a estimativa é de um prejuízo ao erário que chega a um montante de mais de 440 milhões de reais. Quando uma obra é paralisada, os recursos públicos destinados a essa construção ou melhoria muitas vezes acabam sendo desperdiçados, sobretudo quando a paralisação perdura por muito tempo e o que já foi feito acaba se deteriorando pela ação do tempo ou de vândalos.
BM - Esse número se refere a obras estaduais, municipais ou federais?
UA - São obras com fontes de recursos diversas, sejam verbas federal, estadual ou municipal. Nossos técnicos inicialmente enviaram ofícios aos jurisdicionados, que repassaram informações sobre o quantitativo dessas obras e outros detalhes também solicitados, como a origem dos recursos, o tempo e o motivo da paralisação.
BM - O senhor participou recentemente de um debate no STF, comandado pelo ministro Dias Toffoli, sobre o tema. Qual é a avaliação que se faz nacionalmente, sobre o problema das obras paradas no Brasil?
UA - Esse encontro foi fundamental para que o país avance na busca por soluções para esse problema, que é nacional. O ministro Toffoli mobilizou as Cortes de Contas de todo o país, de modo que elaborem levantamentos retratando as realidades locais.
Em seguida, esses dados serão reunidos num grande relatório nacional. A ideia é que o Poder Judiciário possa destravar essas obras, ajudar nos embaraços jurídicos que porventura existam, desenvolvendo o país e impulsionando nossa economia, além de melhorar as condições de vida das comunidades, com estradas, escolas, creches, hospitais, entre outras benfeitorias.
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BM - Há solução à vista para essa questão? Qual?
UA - Acredito que sim, e é justamente essa resposta que estamos buscando de forma conjunta. Na reunião com o ministro Toffoli tomamos conhecimento, por exemplo, da iniciativa de alguns governos estaduais que estariam interessados em dar continuidade a essas obras com recursos próprios, no entanto, foi enfatizado também que é preciso ter segurança jurídica para que isso seja feito.
BM - Qual o principal motivo que leva à paralisação das obras?
UA - Ao menos no contexto do nosso relatório, vimos que os principais motivos que levam às paralisações são a falta de pagamento por interrupção do repasse dos recursos dos convênios e aporte de contrapartidas, além da morosidade dos serviços e até mesmo abandono das obras por parte das empresas contratadas. Mas há ainda outros motivos como falhas na elaboração ou na própria execução dos projetos.
BM - Há obras paradas por decisões judiciais ou do próprio TCE? Por que isso acontece?
UA - Em Sergipe, entre os motivos constantes do nosso diagnóstico, não há registro de decisão judicial que esteja impedindo a retomada de obra paralisada. Existem processos estabelecidos a partir de auditorias e ações do Tribunal de Contas ou do Ministério Público em consequência de irregularidades detectadas em procedimentos licitatórios, não cumprimento de outras formalidades legais ou até mesmo falhas técnicas nos projetos. É preciso ir mais fundo em cada caso.
BM - O que o TCE pode fazer para amenizar este problema em Sergipe?
UA - Nosso primeiro passo foi a elaboração desse diagnóstico que iremos remeter ao STF. Outra medida que já encaminhamos também foi a imediata distribuição desse relatório para os conselheiros do Tribunal. Como cada conselheiro é responsável por relatar os processos de determinadas áreas de controle e inspeção, eles terão agora conhecimento mais amplo acerca das obras paralisadas que estão situadas em cada uma dessas áreas e certamente irão adotar as medidas mais adequadas para contribuir na busca pela solução do problema.
BM - Por que tantas empresas abandonam obras públicas? Não há punição para as que fazem isso?
UA - Pelo que vemos, em alguns casos, as empresas alegam crise financeira. Em outros reclamam de atrasos de pagamentos e falta de recursos públicos. Há também situações de gestões que negligenciam em seus planejamentos, que contratam obras sem assegurar antes os recursos suficientes, etc.
As discussões no âmbito dos órgãos de controle apontam no sentido de que a legislação pertinente deveria ter mais clareza e objetividade na contratação das obras e também conter punições mais severas contra empresas que eventualmente não cumpram com suas obrigações, inclusive o impedimento de participar de novas licitações e contratos. Além disso, é fundamental se exigir que as empresas contratadas pelo poder público apresentem garantias mais concretas de que terão reais condições econômicas e financeiras para a plena execução da respectiva obra.
BM - Há casos de obras que chegaram a estar quase concluídas, mas foram paralisadasm, e o que foi feito se perdeu? Há algum exemplo?
UA - Há, sim, infelizmente, alguns casos desse tipo. Após mapearmos as obras paralisadas, devido a uma propositura do Ministério Público de Contas, nossos técnicos da Coordenadoria de Engenharia visitaram as 75 obras mais relevantes, a partir de critérios como volume de recursos e importância social.
Nesse momento chamou nossa atenção casos como o de uma Clínica de Saúde da Família que chegou a estar mais de 90% concluída e atualmente encontra-se praticamente destruída pelo abandono. Como o relatório ainda é preliminar, optamos por não torná-lo público em sua totalidade até que seja feito um estudo mais incisivo de todo o caso, o que deverá ocorrer a partir de agora por meio das coordenadorias de controle e inspeção do TCE.
BM - Com relação às demais ações do TCE no ano 2018, o que mais marcou seu primeiro ano de gestão?
UA - Além do constante aperfeiçoamento dos nossos serviços de controle e fiscalização, destaco um outro especial desenvolvido pelo TCE. Neste um ano de trabalho, juntamente com os demais colegas conselheiros, acredito que criamos melhores condições para que os jurisdicionados aperfeiçoem cada vez mais os serviços da administração pública.
Isso fica bem claro quando citamos trabalhos como a elaboração do Índice de Efetividade de Gestão Municipal (IEGM), as orientações para o aprimoramento dos Portais da Transparência, as constantes instruções e treinamentos de servidores públicos conferidas pela Escola de Contas e as assinaturas de Termos de Ajustamento de Gestão (TAGs).
Atuar de forma preventiva para aprimorar a qualidade da gestão pública em todos os níveis é também uma das mais importantes missões constitucionais atribuídas aos tribunais de contas. E é isso que o colegiado do Tribunal de Contas do Estado de Sergipe - ao longo desses seus 50 anos de atividades - tem feito, procurando não só punir, mas conscientizar e orientar os jurisdicionados para que melhorem cada vez mais a qualidade dos serviços da administração pública.
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