Entre 2006 e 2015, o Brasil registrou 770 óbitos maternos por complicações de um aborto no SUS, mas este número pode ser, em média, pelo menos 30,7% maior – considerando informações registradas nos bancos de dados do Ministério da Saúde.
Isso significa que o aborto está relacionado à morte de mais mulheres no Brasil do que a contabilização oficial dos óbitos vinha indicando.
A constatação é de um estudo inédito que analisou dados públicos dos sistemas nacionais de informação em saúde e que deve ser publicado em breve nos Cadernos de Saúde Pública da Fiocruz.
Ainda segundo dados do Datasus analisados, o aborto representa hoje a quarta causa de morte materna no Brasil. As outras são pressão alta durante a gravidez, hemorragia após o parto e infecções.
A principal razão para esta diferença nos indicadores está na forma como os médicos registram as mortes por aborto. Nem sempre o procedimento aparece como a principal causa de mortes de mulheres, mesmo que elas tenham sido desencadeadas por um aborto induzido.
Muitas vezes, os registros oficiais atestam que a mulher morreu de sepse (infecção generalizada) e peritonite (inflamação por bactéria ou fungo no tecido do abdômen), sem citar que essas complicações estão relacionadas a um aborto realizado anteriormente.
Ao analisar detalhadamente as informações sobre mortalidade, o estudo identificou 195 casos de óbitos entre 2006 e 2013 cujos registros mencionam aborto no histórico, mas que não têm o procedimento como causa principal da morte.
Isso significa que o número de mortes por aborto pode ser bem maior no Brasil do que vinha sendo divulgado com base nos registros oficiais.
“De todas as mortes maternas, o aborto é a causa mais subnotificada, por tudo o que envolve o assunto”, destaca a pesquisadora. “O não preenchimento do atestado vai além de uma questão técnica do profissional. A criminalização, o estigma e a condenação moral fazem com que essa fonte de dados nunca seja absolutamente precisa”.
Em função da frequente subnotificação das complicações por aborto, várias projeções de mortalidade por esta causa levam a números ainda mais altos, ao aplicarem métodos de correção padronizados às estatísticas oficiais.
Desde 2008, o Ministério da Saúde estabelece que todas as mortes de mulheres em idade fértil, entre 10 e 49 anos de idade, precisam ser investigadas pelo Comitê de Mortalidade Materna de cada região do país a fim de determinar suas causas com precisão.
Nos últimos dez anos, a qualidade da investigação de óbitos maternos melhorou muito. A parcela de mortes com causas mal definidas caiu de 8,3% em 2006 para 5,7% em 2015.
Apesar disso, ainda há lacunas. O Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) cobre 96,3% dos óbitos totais estimados no país, mas essa cobertura é desigual entre as regiões (na Norte, por exemplo, é de 89,3%), o que indica que muitas mortes deixam de ser registradas e investigadas.
*Com informações da Agência Patrícia Galvão
Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
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